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Foto do escritorJulia Dill

A penhora sobre créditos provenientes de sites de apostas. Da necessidade de modernização das ferramentas de recuperação de crédito. 

Como é de conhecimento de todos, desde 2018, o mercado de apostas de quota fixa de eventos esportivos é legalizado no Brasil por meio da Lei n.º 13.756/2018, o qual, em 2023, a partir da sanção da Lei n.º 14.790/2023, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal incluíram entre as apostas de quota fixa legalizadas no Brasil, os chamados “jogos online”. Dentre as plataformas de jogos online de quota fixa, o mais conhecido deles é o chamado “Fortune Tiger” ou “Jogo do Tigrinho”. 


De acordo com recente relatório emitido pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA), 22 milhões de pessoas fizeram ao menos uma aposta nas “bets” em 2023, o equivalente a 14% da população brasileira, cujo total de apostadores supera o percentual de pessoas que utilizam os principais produtos de investimento do país, por exemplo os títulos privados, fundos de investimento, títulos públicos etc. Não bastasse, segundo o relatório da ANBIMA, 22% dos apostadores consideram as “bets” um investimento, em que muitos deles dizem ter um “orçamento próprio” somente para apostar.  


À vista deste cenário de notória expansão do uso de sites de apostas para a obtenção de lucro fácil e do exponencial aumento no ajuizamento de execuções judiciais, o qual o Mercado de Capitais se mostra um dos maiores atingidos, a penhora de créditos provenientes de sites de apostas pode ser uma moderna estratégia para que credores possam acessar recursos financeiros de devedores que de outra forma (mais tradicionais como o SisbaJud) poderiam ser de difícil alcance diante da conhecida postura adotada de ocultação patrimonial.  


Como é cediço, grande parte dos sites de apostas possuem em suas plataformas digitais “saldos” em contas de usuários que podem representar ativos financeiros significativos, ao passo que, mesmo chamados de “jogos de azar”, costumam em boa parte de suas apostas premiar a “boa sorte” de vários apostadores.  


Foi justamente esse o entendimento da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao julgar o Agravo de Instrumento n. º 0029225-60.2023.8.19.0000.  

Ao analisar o agravo de instrumento interposto contra decisão que, em execução de título extrajudicial, deferiu o pedido de penhora de crédito perante o site de apostas Betwinner e o Futebol Clube Real Madrid, a colenda Câmara concluiu que a constrição sobre numerário proveniente de tal fonte de renda observa a gradação legal prevista no art. 835, inc. I do CPC [1].  Destacando não ser absoluto o “princípio da execução menos onerosa” e que tal princípio deve ser conjugado com outros igualmente importantes voltados à satisfação eficaz do crédito, o colegiado decidiu que, observados os requisitos da execução judicial e a ausência de oferta de outros meios de pagamento da dívida, o patrimônio do devedor responde por suas dívidas, estando incluído nele os valores obtidos com o site de apostas.  


Outra recente decisão foi proferida nos autos 0037543-96.2021.8.26.0100 pela 27ª Vara Cível do Fórum Central de São Paulo, a qual inédita no âmbito das “bets”, porém igualmente em ação de execução, em que foi autorizada a penhora de créditos mantidos pelo devedor em sites de apostas (bets). A ordem judicial incluiu a expedição de ofícios a dez empresas de apostas online para que forneçam informações sobre a existência de créditos em nome do executado, bem como para que não sejam realizados pagamentos a este devedor e que seja vetada a possibilidade de “praticar qualquer ato de disposição de seu crédito”.  


Por óbvio que a penhora de créditos provenientes de sites de apostas ainda se mostra uma alternativa muito inovadora de recuperação de créditos, inclusive para o segmento de Mercado de Capitais, não sendo atualmente identificadas muitas decisões favoráveis nesse sentido. No entanto, cabe aos credores, diante das dinâmicas manobras de ocultação de patrimônio dos devedores, acompanhar as mudanças no mercado financeiro e às novas tecnologias e, assim, buscar alternativas à satisfação do débito, as quais permitidas a partir da previsão do art. 139, inc. IV do CPC [2], dispositivo legal que consagrou a possibilidade da adoção de “medidas atípicas de execução” com o intuito de compelir o devedor a cumprir com as suas obrigações. 

 

[1] Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; [...]. 

[2] Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste código, incumbindo-lhe: [...]. IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; 

 

 

 

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